sábado, 1 de novembro de 2008

O balconista e a geração X



É provável que você já tenha ouvido por aí alguém dizer que hoje em dia a adolescência se estende até os trinta anos (e há quem diga quarenta). Eu mesmo vivo usando isso como desculpa para me redimir de eventuais futuros fracassos. Mas de onde surgiu essa idéia? Bom, eu não sei, mas encontro uma geração que viveu isso de maneira como nenhuma outra: a geração do início dos anos noventa. É ali, na década do pós-tudo (pós-guerra fria, pós-ditadura, pós-glam rock, pós-extravagâncias, pós-beatles, pós etc.), onde se bateu o martelo para o caminho da informatização digital e onde a globalização se estabeleceu de uma vez que os jovens adolescentes dos anos oitenta desembarcavam na idade adulta.

Kevin Smith era um desses jovens representantes da geração X quando, em 1994, lançou o seu O Balconista. O filme produzido com baixíssimo orçamento acabou recebendo prêmios em Sundance e em Cannes. Com isso, Smith deu início a uma série de filmes que contavam com o mesmo universo de personagens e que discutiam sobre os principais assuntos que permeavam a cabeça dessa geração: cultura pop, problemas com empregos, amigos, namoradas, futuro, sexo, quadrinhos, Star Wars (?!)... Nada muito diferente do que a geração atual discute, com uma ou outra alteração (troque Star Wars por algum Senhor dos Anéis ou Harry Potter, um grunge por um emo ou indie da vida e teremos um acordo).


No universo de filmes como Procura-se Amy, Barrados no Shopping ou Dogma, figuras outsiders transitavam dentro do limbo que é, para alguns, a idade dos vinte e poucos aos trinta anos, que refletia talvez a realidade de seus criadores.


Da grande leva de diretores independentes que emergiram nos Estados Unidos na década de noventa – Richard Linklater, Gus Van Sant, Todd Solondz, Jim Jarmusch (este já vinha se firmando desde a década de 80, com Estranhos no Paraíso ou Daubailó), Edward Burns, além do próprio Smith, para citar apenas alguns nomes – surgiram histórias de personagens que, de alguma forma, negavam-se a aceitar suas condições de mudanças e de assumir o controle de suas vidas. Presos a pensamentos de auto-depreciação, baixa auto-estima (vide Felicidade, de Solondz), dificuldades em assumir responsabilidades e deixar o apego às lembranças do passado, dificuldades de relacionamentos, esses personagens vagavam por aí, discutindo sobre assuntos banais, desses que passam por nossa cabeça numa longa viagem de ônibus no dia-a-dia. Utilizavam as formas mais absurdas possíveis para suprirem suas faltas ou saciarem seus desejos reprimidos em meio a uma década de transição, entre o fim e o começo de um novo século. Resumindo, eram personagens absurdamente ordinários e, exatamente por isso, humanos.


Em O Balconista 2 (2005), é curioso observar como Kevin Smith olha para seu universo dez anos depois, como um Deus que enxerga suas crias e como se intromete em seus destinos. Parece bem claro que o diretor percebe que sua geração recebeu uma espécie de prorrogação para sua adolescência, mas que esse tempo enfim passou e chegou a hora das escolhas serem feitas, seja para o bem ou para o mal, assim como seus personagens.


Agora, próximos dos quarenta anos (alguns mais, poucos menos, e outros que já ultrapassaram esta faixa), a geração X parece enfim encontrar um lugar para si, seja de maneira inquieta (Gus Van Sant tem Elefante, Last Days, Paranoid Park), inventiva (como o prolífico Richard Linklater de filmes tão dispares como Antes do Amanhecer, Escola do Rock e Scanner Darkly) e até desencanada, como os projetos recentes de Smith Menina dos Olhos, O Balconista 2 e Zack and Miri Make a Porno.



E ainda que a obra desses cineastas não traga mais a mesma dose de inventividade de tempos atrás, ela carrega um forte sentimento de honestidade daqueles que viveram seus anos como puderam, e aproveitaram o tempo extra que lhes foi concedido, mesmo que fosse para reclamar desse tempo e do fato dele ter que acabar.

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