terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Velhos problemas...

Reproduzo aqui três interessantes textos publicados no site da Revista Bravo! e que dizem respeito, entre outras coisas, à forma de distribuição dos filmes nacionais, das salas de cinema e do eventual fracasso do chamado "filme de arte". São dois textos de Gabriela Rassy e um texto-depoimento do cineasta Domingos de Oliveira, publicado em seu blog que também faz parte do site da Bravo!, que se complementam e acabam reafirmando alguns fatores que são realidade no que diz respeito a exibição dos filmes nacionais. Sem o intuito de defender as opiniões expressas, acredito que a leitura desses textos sirva como mais uma relevante fonte de informação para aqueles que se interessam pelo cinema nacional, sejam produtores, realizadores ou espectadores.

O Fracasso da Qualidade

O FRACASSO DA QUALIDADE

Tento compreender porque meu filme "Juventude", embora tenha sido um notável sucesso de crítica, mais que isso, junto a amigos, intelectuais e artistas, é um fracasso em número de espectadores atingindo, até hoje, 22 de janeiro de 2009, não mais que 12 mil espectadores. Tento entender como um filme que provoca uma profunda comoção, que é unânime entre as cabeças pensantes ou sensíveis, pode ser um fracasso de bilheteria! O quanto vale o famoso boca a boca no cinema brasileiro? Ele é o verdadeiro espelho do agrado do filme. Quanto vale isto? Em casos como o "Juventude", parece não valer nada. Ou será que a platéia inteligente vai, mas não recomenda? Tudo é possível.

Esse artigo não é sobre o "Juventude" e sim sobre vários outros filmes bons, onde o mesmo ocorreu. É uma tentativa de compreender o fracasso da Qualidade. É preciso, antes de tudo, entender que o mercado é absurdamente dispare. Que dada existência de patrocínios, as despesas gastas com comercialização são muito diferentes, criando, evidentemente, uma concorrência injusta e desleal com os filmes que não têm verba e propaganda. É uma luta de David e Golias, um sendo exibido no cinema ao lado do outro.

Muitas coisas levam o espectador ao cinema além da qualidade. Principalmente:

O número de cópias

O número de cinemas em que foi lançado

Se tem ou não artistas da Globo ou outros igualmente midiáticos

É evidente que esses valores acima falam a favor do chamado "filme comercial" de assunto e linguagem fáceis ou pouco criativos. Claro que há exceções dos bons filmes do divertimento como o de Daniel Filho, que é uma espécie de Monicelli brasileiro. Porém sabemos que falar de números é falar de nada. Números são manipuláveis. É evidente que o agrado de um filme é importante.

Um filme não é feito para divertir, apenas. É feito para ensinar a viver. Será necessário fazer filmes ruins num país pobre como o Brasil? É evidente que não. O necessário é fazer filmes bons. Que cheguem ao coração da platéia. Que lhes ensine a ser melhores pessoas, melhores cidadãos, tornar mais justa nossa cruel sociedade. Dificilmente esse tipo de filme pode ser feito a muitas mãos. Em geral, são filmes de um homem só, o autor, a visão de mundo de um homem que, em achando que a vida vale à pena, grita isso para os outros. Sob forma de elogio das grandes qualidades humanas, a dignidade, a honestidade, o amor, o patriotismo, a ética, ou seja, os valores que construíram essa nossa humanidade. Esses filmes valem à pena ser feitos. Os outros não. Ou melhor, devem ser feitos sem apoio do Estado.

Não há nenhum vestígio na Legislação Brasileira de Cinema de medidas que protejam decididamente esse tipo de filme: o filme de Arte. Muito pelo contrário. Cada vez mais se considera como valor magno a bilheteria bruta. Aquilo que o filme rende em dinheiro. Como se esse fosse seu único valor. A TV Globo estabelece o valor financeiro dos filmes que compra através de bilheteria. Mesmo no moderno Funcine, que é uma ótima idéia, a bilheteria dos filmes anteriores conta prioritariamente.

Bilheteria é importante, sem dúvida. Até numa obra de arte. Tudo de que eu ouvi falar até hoje chegou até mim porque deu dinheiro. Beethoven deu dinheiro. Kafka deu dinheiro. A arte é invencível. Mais cedo ou mais tarde ela alcança a todos e dá dinheiro. Na maior parte das vezes, fora do período de vida do artista. Que, por isso, produziu menos. É uma lástima.

O cinema brasileiro tem de representar o mercado internacional, na pequena faixa disponível para isso. O que tem sido tentado através de filmes que de alguma forma imitam o tipo de filme que os americanos fazem.

O filme de baixo orçamento é desprezado e o altíssimo orçamento louvado. É a máxima que dinheiro traz dinheiro. E traz mesmo. Mas é importante que as autoridades apóiem isso.

Reivindico o Ministério da Arte. Regido por artistas. Fora de qualquer suspeita, que privilegiam somente o mérito. A arte do filme. Não é preciso um ministério com grandes dotações orçamentárias. Seria o minúsculo ministério. Porém ministério. Que ajudasse a criar a importância social do cinema e que fizesse do cinema o retrato do país. Que ajudasse, na sua diversidade, tanto os escolhidos quanto os milionários. Num cinema de alto aspecto e virulência emocional. Esses filmes são os únicos que podem vencer a barreira do mercado internacional. São esses filmes que carregariam a chamada, proclamada e desejada indústria cinematográfica. Assim como a locomotiva carrega o trem. É preciso igualmente incentivar o filme independente e patrociná-lo a posteriori, se for bom. Coisa que é proibido na legislação atual que patrocina roteiros, a forma das mais difíceis de ler de toda a literatura. Preconizo a volta da meritocracia artística. Caso contrário, estaremos diante do primado da mediocridade. Da idéia inútil e repetida, da mensagem conformista. No entanto, são outros valores que, crivados de burocracia criam os editais de patrocínios. Ou dão o dinheiro diretamente.

A incompreensão das autoridades e dos burocratas responsáveis sobre este ponto fundamental é o problema do cinema brasileiro. Para completar, por favor, ninguém levante o argumento de que é difícil e subjetivo julgar o que é ou não é arte. Mentira! Mentira maliciosa! A arte brilha como sol. Dá frutos abundantes em todas as estações. É reconhecível à primeira vista. E, se não for, basta perguntar a um artista de verdade que já tenha emocionado muita gente.

Por mim, boto meu roteiro novo em mérito, a melhor coisa que já escrevi, e também minha peça nova, a melhor que já escrevi, embaixo do braço. Me armo com a lanterna da paciência e saio por aí batendo de porta em porta pedindo, com se fosse um prato de comida, uma inteligente compreensão.

Domingos Oliveira

Rio de janeiro, 22 de janeiro de 2009.

Fonte: http://bravonline.abril.com.br/blog/domingosoliveira/

Por que os filmes nacionais não são exibidos?


Leis de incentivo, sistema de cotas e co-produções com outros países. Com o auxílio dessas medidas, o cinema brasileiro se desenvolveu muito nos últimos anos. Mas a escassez de salas, a concorrência brutal e a defasada indústria da distribuição ainda dificultam a chegada de filmes ao circuito comercial.


Por Gabriela Rassy

A produção cinematográfica nacional retomou há mais de uma década sua força. Apesar disso, o cinema brasileiro ainda não conquistou proporcionalmente um público tão significativo. Muitos filmes produzidos ainda não chegam às telas. E parte das razões para isso podem ser encontradas nas próprias estratégias usadas para viabilizar a produção.

As leis do Audiovisual e Rouanet são, hoje, as maiores fontes de incentivo para os filmes brasileiros. Elas possibilitam que empresas financiem eventos culturais em troca da dedução de parte do imposto de renda. Nesses casos, o empresário investe, deduz do imposto e aposta no lucro do filme. Mas, segundo o advogado José Maurício Fittipaldi, sócio do escritório Cesnik Quintino & Salinas, especializado em entretenimento e cultura, a prática não funciona bem assim. "Raríssimos filmes dão lucro, então essa não é a preocupação do patrocinador, que investe mais pelo benefício fiscal, que é muito grande", explica Fittipaldi.

Outra alternativa para a produção que a lei permite é a associação com empresas estrangeiras. Quando um filme de outro país é exibido no Brasil, a distribuidora paga um imposto. Pela lei, a empresa pode reverter parte desse imposto para co-produzir outro filme com uma produtora brasileira. "Muitos filmes brasileiros foram viabilizados graças à participação de empresas estrangeiras. Por um lado, quanto mais as empresas estrangeiras lucrarem no Brasil, mais dinheiro elas vão ter para fazer filmes", explica. O que, como as leis de incentivo, têm um colateral. "Por outro lado, elas produzem também os principais concorrentes dos filmes brasileiros", alerta o advogado.

Retomada

O Brasil tem hoje um déficit brutal de salas de exibição e pouquíssimo incentivo à prática de exibição - apenas 9% nos municípios do país têm salas de cinema. Mesmo com a limitada infra-estrutura, é reconhecível que, desde a retomada, o número de filmes nacionais exibidos aumentou muito. "Cresceu o número de distribuidoras dos filmes nacionais e, em 2007, tivemos 82 filmes lançados no cinema. Esse ano começou bem com a estréia de Se eu fosse você 2 que é líder de renda com 4 ou 5 semanas seguidas em cartaz", aponta Pedro Butcher, editor do site Filme B, especializado em mercado cinematográfico.

Outro ponto que colabora com uma produção mais vertiginosa de cinema brasileiro é a facilidade da tecnologia digital. Com ela, o custo para fazer um filme cai consideravelmente, já que uma cópia de 35mm sai, em média, U$ 2 mil.

O crítico de cinema e produtor, Leonardo Mecchi, acredita que hoje há um descompasso entre o modo que os produtores e distribuidores pensam em exibir cinema e a forma como o espectador está consumindo esse tipo de conteúdo. "Existe uma contradição que é o aumento cada vez maior da produção exatamente no momento em que o público que frequenta as salas de cinema cai cada vez mais. Outras mídias (TV, DVD, Internet) acabam assumindo a preferência do espectador na hora de buscar uma alternativa para ver os filmes", disse Mecchi.

Para o produtor, DVDs, locadoras e até mesmo parte dos canais por assinatura estarão completamente obsoletos em um futuro não muito distante. "Você terá uma videoteca virtualmente ilimitada disponível a um toque do teclado, em tempo real e em altíssima definição. Não digo que será o fim do cinema, mas as salas escuras ficarão limitadas a uma restrita elite de apreciadores do cinema enquanto arte (da mesma forma que um museu não é tão frequentado quanto um shopping center)", considera Mecchi.

Festivais

Apesar do público não ter sido tão bom nos últimos dois anos, Butcher ainda aponta outros lados: a imensa quantidade de festivais de cinema, que dão oportunidade de uma cidade ver um filme brasileiro, e a redução dos chamados "sem tela", que são os filmes que não encontravam salas de exibição. "Muitos hoje fazem acordos prévios de exibição com distribuidoras. Os filmes que estão prontos, em geral, estão lançados ou já passaram nos festivais. Portanto, eles acabam chegando às telas, mas em poucas cidades", disse Butcher.

O Brasil possui hoje um amplo circuito de festivais que levam o cinema para mais de 2 milhões de espectadores por ano. E, além dos festivais serem acolhedores com filmes menos comerciais, têm a vantagem de levar o cinema a cidades que não possuem salas de exibição.

"Grande parte do público do cinema brasileiro simplesmente não tem acesso aos filmes - ou porque eles não possuem salas de cinema em suas cidades, ou porque os filmes não chegam a ser programados nessas salas. Além disso, quase todos os festivais brasileiros possuem programação gratuita, o que ajuda a sanar um outro grande fator que motiva a queda de público para o cinema no Brasil: os altíssimos preços dos ingressos", explica Leonardo Mecchi.

Conteúdo

Para Marcelo Dória, produtor de O Cheiro do Ralo, o problema dos filmes brasileiros está no conteúdo. "Os filmes nacionais não são bons produtos. Eles não contam as histórias que o público quer assistir.  Quem vai ao cinema vai ver o Homem Aranha. Brasileiro quer fazer filme cabeça. Lá fora, filme é produto", afirmou Dória.

O produtor acredita que os profissionais fazem filmes para si próprios, sem se preocupar com o mercado ou com a qualidade. "Se alguém vai acreditar que o filme vai dar público, ele vai ser exibido, se não vai ficar 100% dependente de incentivo", declarou.

Pedro Butcher acredita que a produção brasileira começou a mudar agora. "Projetos mais comerciais estão começando, mas o perfil da produção brasileira ainda é muito baseado no conceito de filmes de autores, com temática mais difícil", disse o editor do Filme B.

Fonte: http://bravonline.abril.com.br/conteudo/assunto/filmes-nacionais-nao-sao-exibidos-cota-cinema-419218.shtml

Cotas além da fronteira


Para proteger seus cinemas nacionais, diversos países utilizam o sistema "cota de tela". A cota determina a quantidade de filmes nacionais que devem ser exibidos por ano, no país


Por Gabriela Rassy

No Brasil, a Cota de Tela foi mantida de 2007 para 2009, mas o mecanismo foi estabelecido no país em 1934. A determinação é calculada por dias em exibição, mas depende do número de salas de cada complexo. O mínimo estipulado, por exemplo, para um cinema de apenas uma sala, são dois títulos diferentes lançados ao ano, que fiquem, pelo menos, 28 dias em cartaz. Já um complexo de 11 salas, deve exibir um mínimo de 11 títulos por 506 dias. Acima de 11 salas, o número de filmes é o mesmo, mas a quantidade de dias aumenta.

A Espanha, após revisar o sistema de regulação e fomento à cinematografia em 2007, determinou que a cota fosse baseada em sessões e não mais em dias, considerando que filmes espanhóis ou da União Européia devem ser exibidos em 25% das sessões. Para os canais de televisão, que já tinham que destinar 5% de seu faturamento anual para o financiamento de filmes, a reformulação agora exige que este percentual possa chegar até 12%, mas com variações de acordo com a programação do canal.

A Coréia do Sul, país que vem firmando-se com pólo de produção audiovisual diversificada e de qualidade internacionalmente reconhecida, apresenta uma das maiores taxas de market share para filmes nacionais (cerca de 50%). A política de cota de tela, adotada a partir de 2006, reserva 73 dias anuais para produções cinematográficas nacionais, sendo que, anteriormente, esta cota era de 146 dias anuais.

Desde janeiro de 2009, a Argentina apresentou uma revisão no mecanismo de cotas. Além da quantidade mínima de um filme nacional por trimestre, para cada sala, foi estabelecida a denominada "média de continuidade". Assim, os filmes argentinos que atingirem a média mínima de público estabelecida por lei permanecerão obrigatoriamente em cartaz na mesma sala. Para isso, os títulos são divididos em categorias, de acordo com a dimensão de seu lançamento, e é considerado o tamanho da sala em que o filme foi exibido e a temporada em questão (alta ou baixa). A nova sistemática argentina determina que os filmes de estréia fiquem, no mínimo, duas semanas em cartaz. As informações são da Ancine (Agência Nacional de Cinema).

Alguns países, como a China, optaram historicamente pela adoção do modelo de "cota de importação" de filmes estrangeiros. Apesar da gradual abertura de mercado, o país ainda limita boa parte do conteúdo que vem de fora - apenas 50 títulos por ano. "É um misto de proteção com censura", disse Pedro Butcher.

O cinema francês estipula uma cota para canais de televisão. Segundo informações do site Filme B, 60% do número total de filmes exibidos por ano para cada canal deve ser obras européias, e desses, 40% precisam ser filmes falados em francês.

Fonte:  http://bravonline.abril.com.br/conteudo/assunto/cotas-alem-fronteira-cinema-419217.shtml

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