segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Versão brasileira...

A dublagem é e, aparentemente, ainda será por algum tempo um assunto controverso no Brasil. Opiniões a favor ou contra brotam de todos os lados, alimentando acalorados debates a respeito do tema e um consenso geral é ainda uma utopia distante. Decidi falar um pouco sobre a dublagem não para por mais “lenha na fogueira”, mas por uma necessidade que senti de escrever sobre o assunto, e essa necessidade partiu de um sentimento de admiração pelos profissionais desse trabalho, não o contrário.


São muitos os argumentos “contra-dublagem”. Desde a “atuação” do dublador (que, geralmente, é também ator de formação) à qualidade de som da dublagem nacional, os detratores desse tipo de trabalho tocam sempre em pontos importantes e fazem críticas pontuais e de verdadeira relevância em muitos casos, mas não em todos. O mais freqüente dos argumentos “contra-dublagem” merece um destaque: o que afirma que a dublagem altera a atuação original do dublador/ator/atriz. Essa afirmação não é errônea. Existem trabalhos onde a dublagem modifica de maneira considerável a voz original, podendo mesmo resultar num produto inferior a seu original, mas essa não é a regra. Para as mudanças no texto, a dublagem deixa claro bem no início que estamos assistindo a uma “versão brasileira”, e não “tradução brasileira” ( “versão brasileira, Herbert Richers”, alguém se lembra?). Xiitas de plantão não podem negar que cada língua possui expressões intraduzíveis ou de significados que, para nós, não fariam o menor sentido, pois dizem respeito a outras vivências e culturas bastante diferentes da nossa. Ou será que podemos esquecer que mesmo as apropriadas legendas passam pelo mesmo sistema de “adaptação”, quando não simplificam textos inteiros? Uma vez que existem histórias de temática universal, não há problema algum em encontrar personagens com sotaques paulistas, cariocas, baianos, jargões como “o cão chupando manga” ou “qualé neguinho” se isso for usado de maneira a contribuir com a identificação com tal personagem ou para nossa melhor compreensão da história – que muitas vezes é o que acaba sustentando a relação filme-espectador. A verdade é que existe um equilíbrio no número de adaptações boas e ruins no que se refere à dublagem nacional. O lugar mais apropriado para se encontrar esse equilíbrio são em trabalhos animados, seja nos tradicionais desenhos ou animes da televisão, ou nos longas-metragens animados que chegam todos os anos às telas de cinema. Por ter uma linguagem mais solta, normalmente com brincadeiras, piadas ou trocadilhos, as animações necessitam de uma adaptação. Um outro ponto freqüente é a questão que se levanta de que “se estamos assistindo um filme dublado, quer dizer que não acompanhamos o desempenho do ator original, uma vez que o ouvimos através de outra pessoa, ouvimos a outra pessoa”. Mas essa afirmação não leva em conta que, no caso dos filmes, o dublador procura, da maneira mais próxima possível, sustentar a entonação, o ritmo, o modo e tudo o que compõe a voz do ator original, não fugindo de sua característica original. Um recurso que vem perdendo um pouco de freqüência por motivos eu desconheço, mas que ainda é utilizado no Brasil, é o recurso do dublador “boneco”. Esse é o caso de dubladores que quase sempre dublam a voz do mesmo ator. Alguns bons exemplos são Mário Jorge, dublador do John Travolta, ou saudoso Newton da Matta, falecido em 2006 e dublador do Bruce Willis.


Pensar na dublagem como uma deturpação da obra original parece às vezes um pensamento bastante ingênuo e desinformado quanto aos profissionais do ramo. No Brasil, o dublador tem de ter registro de ator – até quatorze anos, o jovem não precisa de registro profissional, mas de uma autorização da Vara da Infância e Juventude – e para se obter esse registro, excluindo-se o caso de “eventuais” picaretagens que acontecem em todas as áreas, é preciso que suas atividades como ator ou artista sejam comprovadas com um portfólio ou qualquer outro meio de registro de suas atividades no meio. Além disso, a maior parte dos dubladores nacionais são profissionais que fazem da dublagem sua principal atividade de trabalho, ou seja, há aí todo um estudo acadêmico de atuação somado a uma experiência de campo específica, que é cada vez mais aperfeiçoada com o passar dos anos. E não só isso, dão aulas em escolas de dramatização, atuam em peças de teatro, eventualmente fazem trabalho menores na televisão ou cinema, desenham quadrinhos, escrevem, enfim, realizam uma inumerável quantidade de trabalhos diversos ao de dublagem mas que podem comprovar suas habilidades para esta função.


Claro que não são todos os trabalhos dublados que são dignos de nota e existem estúdios que realmente dispõem de material precário e profissionais inexperientes, mas isso é um fato natural, assim como existem filmes ruins ou com características ruins. Mais fundamentadas seriam as críticas às distribuidoras que cada vez mais adquirem o hábito de utilizar “celebridades” da televisão para dublar os filmes de potencial lucrativo. Atores sem a menor preparação são colocados como protagonista, reservando para os dubladores profissionais os papéis de coadjuvantes que, não raro, roubam a cena. E essa manobra de marketing não é uma decisão dos estúdios, mas das distribuidoras.


Mas o fator mais impressionante é pensar no número de pessoas que critica o material dublado num país onde há cerca de 16 milhões de analfabetos, além das pessoas com dificuldades de leituras por N fatores e, claro, das crianças ainda em idade de alfabetização.



O direito de acesso ao áudio original deve ser inegável àqueles que optarem por esse material, mas que a mesma forma se dê no que diz respeito ao material de áudio dublado. Talvez, ao invés de criticar se uma produção deva ou não ser dublada, fosse mais relevante investir em estudos para uma melhor distribuição e divisão dos dois tipos de áudio (original e dublado), de forma que cada grupo pudesse desfrutar da obra audiovisual da maneira que achar melhor, mas, infelizmente, isso parece ainda uma utopia frente a uma discussão generalizada, de maneira muitas vezes desinformada e preconceituosa.


Por ora, ficam meus parabéns a tantos profissionais da área como Guilherme Briggs, Alexandre Moreno, Alessandra Araújo, Alfredo Rollo, Bianca Alencar, Márcia Regina, Wendell Bezerra, Waldyr Santana, Garcia Neto, Mirian Fischer, Élcio Sodré, Hermes Barolli, Cecília Lemes, Carla Pompillo, Márcio Seixas, e tantos outros.


A seguir, o link para um trabalho feito por alunos da PUC-Rio sobre dublagem.






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[youtube=http://br.youtube.com/watch?v=tG4ddr-Slh0&feature=related]


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